O Brasil tem hoje dois problemas simultâneos a resolver no seu sistema rodoviário. Um é a insuficiência de rodovias pavimentadas em relação às dimensões e necessidades do País e o outro é o mau estado de grande parte de nossas estradas. Um recente trabalho - O Mito do Rodoviarismo Brasileiro - elaborado pelo doutor Geraldo Vianna, presidente por seis anos da Associação Nacional de Transporte de Cargas e Logística (NTC & Logística), confirma, de modo claro, o primeiro problema, mostrando a deficiência da infra-estrutura logística do País tanto no segmento rodoviário como no ferroviário. O estudo mostra que entre as 20 maiores economias (PIBs) do mundo, o Brasil é o último em porcentual de rodovias pavimentadas sobre o total de estradas existentes. Outro dado preocupante é a 13ª posição na extensão de rodovias pavimentadas, atrás de seis países desenvolvidos com territórios pequenos (15 a 35 vezes menores), e de nossos três concorrentes no grupo de países do chamado Bric, além dos Estados Unidos, do Canadá e da Austrália, de extensão territorial próxima à nossa. Vianna revela também que só em 2 desses 20 países existem mais veículos por quilômetro de rodovia pavimentada. Com 159,3 veículos por quilômetro, só perdemos da Coréia do Sul e do México. Esse excesso de veículos, além de criar congestionamentos, se reflete nos indicadores de morte em acidentes rodoviários, em que o Brasil é campeão, seguido pela Coréia. A conclusão de quem lê o interessante estudo é clara: o Brasil precisa aumentar sua rede rodoviária pavimentada, se quiser evitar um apagão logístico, além de reduzir o apavorante número de mortes e acidentes nas rodovias. Com os dados levantados, o autor calculou também o chamado Índice de Mortara, que relaciona a infra-estrutura com a extensão territorial, população e frota de veículos. O Brasil fica em último tanto em rodovias pavimentadas como no somatório de rodovias pavimentadas, ferrovias e hidrovias (e penúltimo considerando o índice apenas para ferrovias). O segundo problema, o mau estado das estradas, vem sendo mostrado, de forma indiscutível, pelas Pesquisas Rodoviárias anuais da Confederação Nacional dos Transportes (CNT). Uma vez que não existem condições objetivas no Brasil, como no restante do mundo, nem para a adequada manutenção nem para a ampliação e modernização dos sistemas rodoviários apenas com recursos tributários, o caminho para superar o desafio de melhorar e aumentar essa infra-estrutura rodoviária passa naturalmente por uma combinação de alternativas: concessões, Parcerias Público-Privadas (PPPs) e investimento público direto. Assim, já não se discute o acerto da decisão de transferir para a iniciativa privada a responsabilidade pela operação dos trechos rodoviários mais relevantes, onde é possível cobrar tarifas de pedágio compatíveis com os benefícios recebidos pelos usuários. A discussão atual se limita ao valor das tarifas praticadas, que dependem diretamente do modelo de concessão utilizado. Existem dois modelos básicos para essa transferência da gestão de rodovias à iniciativa privada: o primeiro envolve apenas a operação e a conservação de trechos existentes, com poucas ampliações, e a eventual recuperação inicial de trechos degradados - é a opção de menor custo para o usuário, com tarifas baixas. O segundo modelo envolve ampliações de maior vulto e abertura de trechos novos, além da imposição do ônus da concessão, mediante pagamento em dinheiro ou a obrigação de manter trechos das rodovias de acesso à concedida, e tem sido o mais utilizado em outros países. São dois processos muito diferentes, que correspondem a visões diversas sobre a infra-estrutura rodoviária. Na opção de menor tarifa, que tem sido adotada nas concessões federais, se privilegia o baixo custo para o usuário e, em conseqüência, também se limita o volume de obras de ampliação para evitar o encarecimento do processo. Na outra opção, a chamada concessão onerosa, o conceito é diverso, uma vez que se busca uma visão mais integrada do aperfeiçoamento do sistema rodoviário e de sua competitividade com outros modais. O valor da tarifa será necessariamente mais alto, mas a concessão contempla um maior volume de obras de ampliação. E o chamado ônus da concessão é usado em rodovias de acesso, vicinais, prolongamentos e complementação do sistema. Os dois procedimentos têm vantagens e desvantagens. No caso da concessão onerosa, o usuário paga mais. Em compensação, o Estado pode oferecer a todos uma estrutura rodoviária não apenas melhorada, mas ampliada, atendendo à carência demonstrada no trabalho desenvolvido por Vianna da NTC & Logística. No caso da concessão pela menor tarifa, o usuário da rodovia em questão paga menos, mas nem ele nem a região contarão com obras significativas e ampliações do sistema que venham a atender à expansão da rede rodoviária e ao aumento do tráfego. E, se o usuário tiver de continuar sua viagem após o trecho pedagiado, vai transitar por rodovias em mau estado, porque faltam recursos para mantê-las. A escolha de um ou outro modelo resulta, portanto, de uma decisão política: ou se faz o usuário direto da rodovia pagar apenas pelo uso do trecho pedagiado, melhor operado e conservado, ou ele paga mais para ter um sistema rodoviário de melhor qualidade dentro e fora desse trecho. Vale lembrar que o Brasil não precisa apenas manter e conservar sua atual malha rodoviária, precisa também investir para ampliá-la significativamente, fazendo o mesmo com os outros modais de transporte, como mostra claramente o trabalho de Vianna.
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